18 novembro 2005

Avó

Avó
Manhã cedo pisei o chão da casa da avó. A avó que já não tenho. A mulher de rugas na guelra que não morre em mim. Era nela que via o fiel retrato do Barroso. Uma gravura de olhos azuis, cabelo imenso, comprido e secretamente tapado. A voz que já não escuto povoa o amparo sereno que algumas vezes apanho. Sempre que subo as escadas elevo o sorriso mais escondido. Penetro nelas como se invadisse terreno meu.
Custa-me sorrir porque a falta não tem asas. Apalpo as paredes e ainda sinto o toque dos dedos da avó. Nunca sobra repetição. Tudo é cheiro reconquistado como se a vida não tivesse dias onde a saudade é o amanhã provável. Deixo-me mover pela inquietude e paro.
Viro costas à dor mas não desisto de voltar a escutar a voz da avó.